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HELTON RIBEIRO
Colaboração para Folha Online

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Ele e Charlie Parker foram os “pais” do bebop, mais influente estilo de jazz dos últimos 60 anos. Dizzy Gillespie foi também um dos melhores trompetistas do gênero e pioneiro do chamado “latin jazz”.

De família pobre, John Birks Gillespie nasceu em 21 de outubro de 1917 em Cheraw, Carolina do Sul. Aprendeu trompete aos 15 anos, e aos 20 tocava em big bands na Filadélfia. No início dos anos 40, já em Nova York, acompanhou Duke Ellington e Ella Fitzgerald, e começou a escrever clássicos como “Night in Tunisia” e “Woody’n’You”. Na orquestra de Earl Hines, em 43, conheceu Charlie Parker.

Após os shows das big bands em que tocavam, ele e Parker se reuniam em pequenos bares para longas jam sessions (improvisos) com outros jovens músicos. Nessas noitadas desenvolveu-se o bebop, que os rapazes começariam a gravar a partir de 45: “Hot House”, “Groovin’ High”, “Salt Peanuts” e outros clássicos.

No ano seguinte, Gillespie formou uma big bang, explorando ritmos cubanos em “Manteca” e “Cubana Be/Cubana Bop”. Pela orquestra e subsequentes grupos menores passaram John Coltrane, Sonny Rollins, Stan Getz e outros que viriam a ser também mestres do jazz.

Até os anos 70 ele alternou big bands e pequenos grupos, e participou do “supergrupo” Giants of Jazz, com Thelonious Monk, Art Blakey e outros. Seu último projeto foi a United Nation Orchestra, que reunia músicos de vários países, entre eles os brasileiros Cláudio Roditi e Flora Purim. Ele deixou de tocar em 92, e morreu em 6 de janeiro do ano seguinte, em Englewood, Nova Jersey, de câncer no pâncreas.

Contexto histórico

Até os anos 40, e principalmente durante a Era do Swing, o jazz era visto apenas como diversão, uma música alegre e descompromissada, feita para dançar. Os boppers almejavam mais que isso, queriam fazer do jazz uma forma de arte.

Os instrumentistas se empenhavam em expandir e tornar mais complexa a linguagem do gênero. Desenvolveram novas progressões harmônicas, dissonâncias, fraseados longos e tão rápidos que desafiavam a habilidade técnica dos executantes.

Ao explicar os avanços do bebop, o crítico Leonard Feather fez uma interessante analogia com a linguagem: “É como se alguém com um vocabulário de apenas algumas centenas de palavras e que só formulasse frases curtas adquirisse a faculdade de empregar milhares de palavras e de articulá-las em frases mais longas e complexas”.

Coerentes com essa visão mais acadêmica do jazz, quase como uma ciência a ser pesquisada e desenvolvida, os músicos faziam questão de exibir um ar intelectual. Dizzy Gillespie vestia-se bem e usava óculos de aros redondos que lhe davam a aparência de um professor.

Curiosidades

 

  • Brincalhão

    O apelido Dizzy (tonto) se deve a seu jeito brincalhão. Ele teria sido dado por um músico da Filadélfia, devido às excentricidades de Gillespie no palco, como usar um trompete entortado para cima.

  • Onomatopéia

    A palavra “bebop” é uma onomatopéia que simula duas notas dissonantes tocadas em alta velocidade, um recurso bastante comum nesse estilo jazzístico. Um bom exemplo pode ser ouvido em “Groovin’ High”, de Gillespie.

  • “Embaixador” do jazz

    Gillespie foi o primeiro músico de jazz a fazer turnês internacionais patrocinadas pelo governo americano. De 56 a 58, ele liderou uma big band que excursionou por meio mundo: Oriente Médio, América do Sul (inclusive o Brasil), Europa e Ásia. Políticos conservadores protestaram contra o uso de dinheiro público para promover o jazz.

  • Dando duro

    Talvez ele pudesse entrar para o Guinness (Livro dos Recordes). Só em 89, fez 300 shows em 27 países; tocou em cem cidades de 31 Estados americanos e gravou quatro LPs.

  • Blues do Recife

    A United Nation Orchestra tocava ritmos de vários países, principalmente latino-americanos, como salsa, tango, bolero e samba. Uma das músicas gravadas pelo grupo chama-se “Recife’s Blues”, composta pelo trompetista brasileiro Cláudio Roditi.

Sites relacionados

 

  • www.scaruffi.com – o site italiano traz um bom histórico do surgimento do bebop (com destaque para Gillespie) e uma detalhadíssima discografia do trompetista, que inclui os músicos que gravaram em cada faixa.
  • www.vervemusicgroup.com – O site da gravadora traz uma pequena biografia e comentários sobre os discos lançados por ela, como os clássicos “At Newport” e “Bird and Diz”.
  • www.allmusic.com – O site tem uma acurada biografia, comentários sobre alguns discos (como “At Newport” e “Dizzy’s Big 4”), trechos de suas faixas para ouvir e um vídeo de “Salt Peanuts”.

A matéria acima foi publicada na Folha. Acesse aqui, leia o original e compre a coleção, é imperdível.

Dizzy Gillespie

Publicado: 01/05/2007 em Bebop, Dizzy Gillespie, Jazz

Dizzy GillespieDizzy Gillespie é um dos mentores do bebop, um dos criadores da linguagem do trompete jazzístico moderno, e um verdadeiro embaixador da música. Os únicos trompetistas que se equiparam a Dizzy, em termos de importância musical e histórica, são Louis Armstrong e Miles Davis.

Nascido em Cheraw, Carolina do Sul, John Birks Gillespie experimentou o trombone antes de se decidir aos 12 anos pelo trompete, instrumento com o qual se iniciou profissionalmente aos 14. Tocou em diversas orquestras, na segunda metade dos anos 30 e na no início dos anos 40, como as de Frankie Fairfax, Cab Calloway, Benny Carter, Lionel Hampton, Duke Ellington, Teddy Hill e outros. Dizzy teve como grande modelo o trompetista Roy Eldrige, a quem inclusive substituiu na Teddy Hill Band, em 1937. O jeito irreverente e as brincadeiras que fazia com colegas e mesmo com os próprios regentes lhe valeram não poucas reprimendas e até demissões. Entre 1942 e 1945, Dizzy tocou nas orquestras de Earl Hines e de Billy Eckstine, que consituíram verdadeiros celeiros de talentos do nascente estilo bebop.

Em 1941 Dizzy encontrou Charlie Parker pela primeira vez, quando este tocava na orquestra de Jay McShann. A partir daí, os dois tocaram juntos diversas vezes, com diferentes grupos, sempre gravitando em torno da famosa Rua 52 – eram sem dúvida os maiores astros da cena – e dando contornos definitivos ao bebop. Somente em 1945, porém, Dizzy e Bird finalmente gravariam juntos.

Em 1945 Dizzy opta pelo formato big band. Sua orquestra do período 1946-1950 contou com músicos de peso, como Milt Jackson, John Lewis, Ray Brown e Kenny Clarke (que, juntos, constituiriam a primeira formação do Modern Jazz Quartet), além de Jay Jay Johnson, Yusef Lateef e até John Coltrane. Essa orquestra teve que ser desfeita em 1950 devido a dificuldades econômicas. Mas Dizzy continuou muito ativo, e participou de turnês do Jazz at the Philarmonic. Em 1956 formou novamente uma orquestra, que até 1958 fez turnês patrocinadas pelo Departamento de Estado norte-americano. Nos anos 60, 70 e 80, alternou as big bands com as pequenas formações. Fez numerosíssimas turnês por todo o mundo, tocando com músicos locais sempre que podia. Durante toda a carreira, Dizzy esteve sempre aberto a influências étnicas, como a música cubana, brasileira, africana e do Oriente Médio.

Dizzy Gillespie Big Band 1947 groovy man

Dizzy Gillespie é um dos maiores virtuoses do trompete (talvez o maior), e trata de explorar essa qualidade em suas apresentações. Seu fraseado é cheio de elementos surpreendentes e saltos vertiginosos, explorando as notas superagudas do instrumento. Sua capacidade criativa como improvisador parece inesgotável. O arrojo, a agressividade e o humor da música de Dizzy podem ser vistas como uma extensão de sua personalidade de showman e entertainer nato. Dizzy também canta e nunca deixou totalmente de lado o seu lado clown, para deleite das platéias de todo o mundo.

(V.A. Bezerra, 2001)